Quem nunca mudou o horário de uma tarefa para fazê-la com menos distrações e mais energia? Ou buscou aproximar-se profissionalmente de um colega com quem desejasse interagir mais? Ou ainda encontrou um sentido novo para a atividade que realizava? Saiba que nesses momentos você estava praticando o job crafting.
Amy Wrzesniewski e Jane Dutton, que, em 2001, cunharam o termo, definem job crafting como “as mudanças físicas e cognitivas que os indivíduos fazem nos limites das tarefas ou relacionais no seu trabalho. Assim, job crafting é uma ação, e aqueles que o empreendem são ‘job crafters’”.
“Todos fazemos job crafting. Ele está em tudo. Então sejamos intencionais e estratégicos para que possamos ter os melhores benefícios para o indivíduo, para o grupo e para a organização”, declara Meredith Myers, professora na Universidade da Pensilvânia e diretora executiva na Job Crafting, empresa que desenvolve ferramentas para ajudar pessoas a prosperar no trabalho. Ela explica que job crafting pode até ser uma mudança pequena, como alterar o horário de abertura de emails, desde que isso tenha um impacto para a pessoa e que melhore seu trabalho.
Também chamado de redesenho proativo do trabalho ou ações de redesenho do trabalho, o job crafting é o comportamento do colaborador que altera o significado, o conteúdo, as relações ou o processo de trabalho. Esse conceito está dentro do campo da Psicologia Positiva, que, segundo Myers, é a ciência da ótima performance humana.
As motivações e dimensões do job crafting
“O foco do job crafting é criar mais significado e propósito no trabalho”, resume Myers. E Wrzesniewski e Dutton escreveram sobre as três necessidades individuais que são motivação para o job crafting:
- Controle sobre seus empregos a fim de evitar a alienação do trabalho
- Criação de uma autoimagem positiva no trabalho
- Satisfação da necessidade humana básica de conexão com os outros
A partir disso, elas salientaram três dimensões em que pode ocorrer a prática de job crafting. Conforme elas, esse é “um ato psicológico, social e físico”:
- Redesenho da tarefa: muda o escopo das atividades, a sequência, a maneira de realizá-las, o tipo ou o número delas (para mais ou para menos)
- Redesenho cognitivo: muda a forma que o indivíduo percebe o trabalho ou as atividades e seu significado (passa a dar mais importância a ele)
- Redesenho das relações: muda com quais pessoas se vai interagir no trabalho (aproximando-se de colegas que agreguem no dia a dia)
Ghitulescube afirma que, “em geral, os indivíduos moldam seus empregos para obter um melhor ajuste entre o trabalho e sua motivação, seus interesses, suas habilidades e seus entendimentos do trabalho”. Ao moldar as tarefas, as relações e as percepções do trabalho, as pessoas passam a sentir mais como se o trabalho fosse delas, e não da empresa. Elas também identificam suas motivações, forças e potenciais.
Benefícios comprovados cientificamente
Apesar de o job crafting ser, como definiu Ghitulescube, “um processo criativo e improvisado, que não necessariamente visa melhorar o desempenho da tarefa, ajudar os outros ou apoiar os objetivos organizacionais”, estudos mostram resultados positivos em adaptar o trabalho.
De acordo com Bakker e Demerouti, “os funcionários que são motivados por seu trabalho são mais propensos a usar comportamentos de job crafting, que levam a níveis mais altos de recursos de trabalho e pessoais, e ainda mais altos níveis de motivação.”
Esperança, resiliência, autoeficácia e otimismo também cresceram nos job crafters estudados por Vogt, Hakanen, Brauchli, Jenny e Bauer. “Funcionários que proativamente construíram um ambiente de trabalho rico em recursos e desafiador para si mesmos aumentaram seu capital psicológico e engajamento no trabalho.”
Tims, Bakker e Derks descobriram que o aumento dos recursos de trabalho impactou o bem-estar dos funcionários, com mais engajamento e satisfação no trabalho e menos esgotamento (burnout). Em outro estudo, os mesmos autores escreveram que “os funcionários que redesenharam seu nível de demandas e recursos estavam mais engajados e tiveram uma melhor performance”.
Existem também evidências de que o job crafting facilite a criatividade e a inovação. Além disso, estudos apontam que customizar seu trabalho pode ser uma importante ferramenta para que os colaboradores renovem suas energias, aumentem o controle sobre suas vidas profissionais e tenham mais clareza de qual caminho sua carreira está tomando.
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Pesquisas sobre os efeitos do job crafting aplicadas no Google também apontam que, partir do redesenho do trabalho, tanto colegas como chefes percebem aumento da felicidade e da performance do colaborador. Mesmo que ele não conte para ninguém que esteja redesenhando seu trabalho.
O papel das organizações
Para amparar ações de job crafting, primeiro a empresa precisa saber do que ele se trata. A companhia precisa compreender quais recursos as pessoas precisam para tornar o seu trabalho mais satisfatório e esclarecer quais demandas são mais importantes.
Para Manoela Ziebell, professora do curso de Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS, conta que qualquer empresa, de qualquer porte, pode facilitar essas ações, desde que entenda que o job crafting é uma iniciativa dos próprios trabalhadores.
Não é papel da organização dizer o que precisa ser feito. Isso seria um desenho do trabalho (job design), que, de acordo com a professora, é quando a empresa indica métodos ou atribuições. “Por isso chamamos de ‘redesenho do trabalho’ (ou ‘job crafting’) quando é o próprio trabalhador que autoinicia a mudança na forma de realizar essa função”, explica.
A liderança pode auxiliar a ocorrência do job crafting, mas não pode criá-lo. Manoela destaca que os líderes podem “estimular, reconhecer e reforçar a importância na medida em que percebem que alguém está fazendo algo diferente”. Mas, na sua visão, o que os líderes precisam, de fato, é promover recursos para que se consiga fazer job crafting. Recursos esses que incluem pessoas de suporte para que o colaborador realize as entregas necessárias, autonomia, flexibilidade e tempo.
O papel do endomarketing
Manoela acredita que o endomarketing e a comunicação interna contribuem para que as pessoas saibam o que é e entenderem o que é preciso para fazer job crafting. “Mas a ideia não é promover o job crafting em si, e sim oferecer recursos para que as pessoas possam fazê-lo e ajudá-las a perceberem o sentido do seu trabalho”, conclui.
Myers crê que a comunicação sobre job crafting depende muito do contexto e da cultura da organização. Pode ajudar a explicar por que job crafting é importante, pode deixar as pessoas empolgadas com ele, pode focar primeiro nos líderes para que eles passem a mensagem, até pode compartilhar histórias de sucesso e ideias. “Mas nada forçado, a ideia é oferecer a oportunidade, a ciência e o processo, e comunicá-los para que as pessoas possam fazer suas próprias escolhas”, defende.
Como começar no job crafting?
Depois de conhecer mais sobre esse conceito, ficou com vontade de fazer o redesenho proativo do seu trabalho? Louise Lee sugere os primeiros passos, de acordo com a ferramenta Job Crafting Exercise:
Faça uma lista de “antes e depois” ou “de-para”. Primeiro, divide-se o trabalho em blocos de tarefas e as agrupa em quanto tempo e energia se gasta em cada uma delas. Em seguida, cria-se uma versão ideal (mas realista) do trabalho – algo para se almejar.
Essa segunda lista deve levar em conta as atividades que estão mais alinhadas a valores, forças e paixões, que são o centro de onde tomamos decisões. Segundo os criadores da ferramenta, esses atributos são impulsionadores do job crafting.
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De acordo com eles, esse exercício pode ajudar as pessoas a encontrar oportunidades de redesenhar seus trabalhos. “É uma poderosa atividade de autoconhecimento para o sujeito – assim como pode o ser para um time”, elogia Myers.